27 junho 2010

Mercado.

Passou mais uma vez por mim na rua, como já é costume todas as manhãs de sexta-feira. O mercado abre e ela, tal como eu, é das primeiras pessoas a chegar. O cheiro da fruta fresca e do pão acabado de fazer ajuda-nos a mover o corpo da cama até aqui. Mas ela não tem nenhuma obrigação. Já eu...
Só de pensar que queria ser pintor em Paris. Ideia ridícula, talvez. Mas vender fruta no mercado não é o que mais desejo na vida, ainda que tudo isto tenha a sua magia.
Pego no lápis e no caderno de capa negra. Risco aqui, risco ali...até que o desenho se compõe. Mas nunca ninguém irá vê-los, eu sei.
Finalmente aproxima-se da minha barraca. Diz "Bom dia", mas não com a voz doce de outrora.
Hoje está diferente. Não fala tanto, não sorri tanto. Nem sequer tirou os óculos de sol.
Pergunto-lhe se está tudo bem e as lágrimas começam a escorrer-lhe pelo rosto.
Tento dar-lhe a mão, meio à toa. Ela foge.
Desde aquele dia que o mercado deixou de ser parte da sua rotina. Desde aquele dia que o mercado perdeu a magia que tinha a meus olhos. Foi naquele dia que fugi para Paris.